1968. Dificilmente outro ano da história do cinema ou da própria história mundial permite que se faça um recorte tão interessante para se discutir as relações que a arte estabelece com o seu tempo. Os 366 dias (1968 foi um ano bissexto!) que separaram 1 de janeiro de 31 de dezembro daquele ano conseguiram reunir uma seqüência de fatos históricos notáveis, que vão da invasão da embaixada americana em Saigon à promulgação do AI-5 no Brasil, passando pelo assassinato de Martin Luther King, pelo massacre na praça de Tlatelolco no México, pela Primavera de Praga e, obviamente, pelas manifestações nas ruas parisienses durante o maio mais famoso da história. No mesmo período, alguns dos maiores diretores do cinema mundial, dentre os quais Stanley Kubrick, Roman Polanski e Sergio Leone, lançavam filmes que não só definiriam suas carreiras, como também seriam decisivos para a futura trajetória da arte cinematográfica. Paralelamente à efervescência cultural, política, social, sexual e ideológica daquela época, o cinema acompanhava o borbulhar da realidade na qual estava imerso, ao mesmo tempo em que registrava para sempre a atmosfera de 1968.
Pensando assim, a mostra de cinema 1968: CINEMA, UTOPIA, REVOLUÇÃO! celebra as quatro décadas decorridas desde aquele mítico ano, com a exibição de 20 filmes de diferentes países, gêneros e realizadores, selecionados em função de sua representatividade, eloqüência e relevância para a história do cinema e para o contexto em que surgiram.
A escolha por exibir filmes lançados – e não filmados ou produzidos – em 1968 se explica pela proposta de discutir o cinema como uma manifestação histórica e cultural tão relevante quanto os acontecimentos à sua volta e, assim como estes, fruto de processos sociais mais amplos, iniciados anos antes.
Naturalmente, filmes não refletem o seu tempo e a sua realidade sempre da mesma maneira. Em alguns dos filmes de 1968, por exemplo, a referência aos acontecimentos do fim dos anos 1960 é intencional e explícita. Em outros, os ecos daquela época são quase imperceptíveis, só se fazendo notar quando analisados à luz do contexto em que os filmes foram produzidos. Seja como for, a capacidade de estabelecer uma relação com o mundo ao seu redor é uma característica inerente ao cinema como forma de expressão e que contribui para o fascínio exercido por ele sobre platéias de diferentes gerações desde o seu surgimento, há mais de 100 anos. Ao comparar os filmes de 1968 com acontecimentos e fatos históricos do mesmo período, a mostra 1968: CINEMA, UTOPIA, REVOLUÇÃO! traça também um paralelo com a atualidade, convidando o espectador a refletir a respeito desse importante papel social do cinema e da forma como ele se mantém presente nos filmes de ontem, hoje e amanhã.